Por Edgar Fernandes*
O setor cerealista de Mato Grosso do Sul, em especial na região da Grande Dourados, atravessa um período de intensas transformações. Empresas responsáveis pela recepção, armazenagem e intermediação da comercialização de grãos convivem hoje com dois movimentos simultâneos: de um lado, a chegada de grandes indústrias de processamento de soja e milho; de outro, a instabilidade econômica global que repercute diretamente no agronegócio brasileiro.
Nos últimos anos, a instalação de unidades industriais de esmagamento e beneficiamento de grãos em diferentes municípios do Estado alterou a lógica do mercado. Essas indústrias, muitas vezes de grande porte e capital internacional, passam a disputar de forma direta a produção local, oferecendo ao produtor alternativas que reduzem a dependência das cerealistas regionais. Embora o movimento traga novos investimentos e empregos, ele gera também maior concentração de mercado e coloca pressão sobre empresas locais, que já operam com margens reduzidas.
O quadro se agrava diante da conjuntura internacional. A relação comercial entre Brasil e Estados Unidos enfrenta um momento de tensão, marcado pela adoção de tarifas adicionais sobre produtos agrícolas brasileiros, o chamado “tarifaço”. Essa medida eleva custos de exportação, reduz a previsibilidade dos contratos e impacta diretamente a cadeia produtiva sul-mato-grossense. As cerealistas, que dependem da fluidez no escoamento de grãos, veem-se expostas a riscos ainda maiores em um mercado volátil e incerto.
Internamente, o aumento dos custos logísticos, o encarecimento dos insumos e a restrição no crédito agrícola completam o cenário desafiador. O acesso a capital de giro tornou-se mais caro e burocrático, dificultando a compra da safra e a manutenção dos estoques. Esse ambiente tem resultado em litígios envolvendo contratos de barter e compra antecipada, além de um número crescente de empresas do setor que recorrem a mecanismos de renegociação de dívidas e recuperação judicial.
Como especialista em reestruturação empresarial, entendo que o caminho para a sustentabilidade do setor passa por medidas preventivas: revisão contratual, renegociação estratégica de passivos e maior profissionalização na gestão de riscos. É preciso também fortalecer o diálogo entre produtores, cerealistas, indústrias e instituições financeiras, a fim de construir soluções conjuntas que permitam ao Mato Grosso do Sul manter-se competitivo em um mercado global cada vez mais exigente.
O agronegócio continua sendo um dos motores da economia sul-mato-grossense, e a região da Grande Dourados segue como polo estratégico para a produção de grãos. Entretanto, sem adaptação e planejamento, parte significativa das cerealistas poderá enfrentar dificuldades em assegurar sua sobrevivência neste novo cenário.
*Advogado especialista em Turnaround Empresarial